
A primeira vez que apresentei um livro, em 2001, não sabia o que me esperava. Foi na Fnac do Chiado em 2001, estava lá, para meu feliz terror, muita, muita gente, cheguei atrasado, não conseguia estacionar o carro e passei por todas as peripécias possíveis. Em todo o caso não posso dizer que estava totalmente às escuras: se houve algo que intui nessa altura é que tal como quando se conhece uma pessoa, a primeira impressão é muito importante e há que saber rentabilizá-la com graça e espírito.
Na minha primeira apresentação usei, se a memória não me atraiçoa em demasia, usei Eugénio de Andrade para dizer que "toda a poesia é luminosa mesmo a mais obscura" e Eça, para justificar o meu livro e a sua partilha/publicação, com aquele ditame "galego" do homem que partilha o quarto e a sua história pessoal em Singularidades de uma rapariga loura (o novo filme de Manoel de Oliveira que me terá como ávido e curioso espectador".
Na apresentação das Feridas já tive ao meu lado o meu amigo José Luis Peixoto e, por vezes, o Jorge Reis-Sá e o Valter Hugo Mãe. Costinhas quentes protegidas pelo poema de Padrón e a perda da timidez.
A apresentação do Diálogo de Vultos, a primeira, na Fnac do Chiado foi bem mais atribulada emocionalmente e nem todas as tentativas para segurar dentro de mim a força deste livro perante uma audiência foram bem sucedidas. Livraram-me de males piores a minha amiga Bárbara (Guimarães), um público surpreendido pela minha humanidade, talvez,mas muito caloroso e o filme intenso da minha amiga Dora Carvalhas pontuado pela música adequada e profunda do meu amigo de longa data Luís Lamelas/Euthymia e a minha voz lendo dos Diálogos. (ver video em blog)
Seguiram-se apresentações várias sempre com a generosidade de pessoas como a minha prima Rita Baleiro, da Universidade do Algarve, ou a única e inimitável professora de Barcelos, a minha querida Fátima Aetheria, em Braga e em Barcelos, forças a adicionar aos vultos apresentados.
Na contabilidade das impressões, foram muitos os locais, as ocasiões, os sentimentos. Houve espaço ao humor e ao amor e à dor em ambos. Numa apresentação num festival de cinema deu para brilhar com uma anedota (Duas cabras estão a comer a pélícula de um filme. Pergunta uma à outra: "E que tal?". Resposta: "Bah! Gostei mais do livro."); noutra do Antídoto (livro disco dos Moonspell e José Luís Peixoto) convites para ir a Cabo Verde (nunca fomos) e epítetos de "bébes de Abril"; ressacas na Madeira, enfim tudo um mundo de impressões.
Não sei se para aligeirar o peso dos vultos comecei a ler/enquadrar as apresentações com a divulgação do meu primeiro poema que escrevi em 1991-1992 (11ºano) quase como numa aposta com uma Professora de Psicologia, para ter uma nota melhor (resultou!) e constituia o grand finale de uma aula/trabalho de grupo sobre o suicidio. Este era lido ao som do Adágio para cordas de Samuel Barber (uma das minhas peças musicais) e toda a aula era diferente e down, com excertos de filmes como o Clube dos poetas mortos (Peter Weir) ou Videodrome (Cronenberg), um momento estranho até mas que deu não só para subir a nota como para causar uma impressão em quem lá esteve.
Rezava assim o poema: (texto non varieteur :) - com as rimas próprias dos sweet seventeen)
Não encontrei a beleza
na morte da natureza
na humana omissão
na derradeira confissão
no eterno recalcamento
no asifixiar do sentimento
A espiral humana da cobardia
que venera a hipocrisia
encontram em nós- descrentes-que pomos fim à vida
escape para as torrentes - um escape suicida.
O esforço inglório da vida
nas mãos do herói do século XX termina
o esforço inglório da vida
termina às mãos do suicida
que tremem diante do mistério
que enchem sem cessar o necrotério (!)
Para onde irei? - o dilema eterno
só sei que abandonarei o real inferno
o paraíso perdido é já uma certeza
eu só quero encontrar a beleza
E tinha este aspecto que vem no canto superior esquerdo do post. É um manuscrito original. Durou até hoje :)
Obrigado a todos quanto comentaram, continuem a abrir o cofre, até para a semana, bom fim de semana!